Eu já tenho meu veredito!
Nesta edição, tivemos pela primeira vez participações de outros campi, além de poetas de várias idades. Celebramos a Natureza e toda sua complexidade em versos de alunos/as/es do ensino fundamental, médio, licenciatura, do PROEJA, servidores e estagiários.
A banca de avaliação teve a participação de dois bibliotecários, dois professores de língua portuguesa e um advogado, todos servidores do Colégio Pedro II e com envolvimento e apreciação da Poesia.
A Biblioteca da Prôa agradece a todos os participantes, a todos os alunos e servidores engajados no Projeto Poetize-se, assim como à banca de avaliação – os professores Lyza e Tiago, os bibliotecários Tatyana e Leonardo e o integrante licenciado da nossa equipe, Marcos – e à aluna Letícia da Silva Malagueta pela arte de divulgação.
E as poesias com melhores avaliações foram:
1º lugar: "Verde é mais que uma cor". Autor: Giovanni Henriques Fraga – Campus Centro, Turma 2106
Meus pés são terra,
Meu choro é mar,
Meu riso é primavera,
Meus pensamentos são ar.
Originário de uma biodiversidade
Que transcende os limites da naturalidade,
Plantando a essência da verdade
Do ser verde além da humanidade.
Sou da terra, um pouco árvore,
Que purifica pulmões carregados
Das energias da terra sem mato,
Lotada de prédios e carros.
Fluindo na água do riacho,
Me perdendo e me achando, eu acho,
Quanto mais longe de casa me vejo,
Mais verde sinto e desejo.
Sem hierarquia em minha mente,
Me fundi ao mato, ainda sou gente,
Não vou ferir aquilo que me sustenta,
Pois se o fizesse, estaria me ferindo.
Meus braços, agora galhos,
Meus olhos, tornaram-se nuvens,
Minha voz, melodia natural,
Meu cabelo, paisagem ambiental.
A grama verde virou meu chão,
Os troncos, minhas paredes,
O céu, um belíssimo teto,
Aonde estou é incerto.
Me embolo nas videiras emocionais,
Apagando cada fragmento de partes digitais,
Me isolando de cadeias virtuais,
E me sentindo vivo nos dias fluviais.
Quando vejo meu amado irmão,
Causando nesse paraíso uma imensa destruição,
O trago para o verde libertador,
E lhe mostro uma fortaleza sem dor.
Me curei da supremacia humana,
Eliminando a poluição do meu sangue,
Me alinhei a seres interessantes,
Por que insistimos na espécie dominante?
A cada árvore que se derruba,
Menos vida se tem para essa gente,
Pois ainda não entendi em que momento
A Natureza para o homem se tornou indiferente.
2º lugar: "Baobá". Autora: Yasmin Flores – Campus Centro, Estagiária do SAE
Bato cabeça e peço a benção a todos os meus ancestrais que plantaram nessa Terra as frutas que hoje eu colho
Sei que não foi sem luta, mas gostaria que soubessem e que essas palavras ecoassem no Orum que sou grata pelo vosso plantio
A todes que passaram pelo Ayê e imprimiram amor nos braços do Povo em Pé
É através das árvores que sinto o vosso abraço
Bato cabeça e peço a benção ao Baobá
Choro as lágrimas que vêm do coração e transbordam os olhos regando o chão
Sinto o amor de uma mais velha que passou por ali
E como é bonito sentir
Que estamos juntas em coração
Que o amor que imprimo aqui, nesta árvore que é o viver, se perpetue e chegue até aqueles que ainda não chegaram na Terra, mas que hão de nascer
Que as crianças aprendam, desde pequeninas
Que luta também se faz com afeto
Que é ele, o amor, que rega a Vida e faz com que ela continue
Chegamos vivos até aqui
porque também nas senzalas tinha festa
E no canto e no corpo, mais do que dança, uma reza
As estratégias de luta e de manutenção da saúde mental são primordialmente do afeto
Aprendi com as árvores que se doar amor é sinal de abundância, é cacho forte, penca farta
E que esse amor vai se apresentar de diversas formas
Queira Oxum que não mais nos assassinem por amarmos quem amamos
Queira Oxumaré que nossos amores em cores também possam reverberar pelos ares
São tão múltiplas as folhas
Também tão diversas as pessoas
Que veneno e remédio
São irmãos gêmeos que habitam a mesma folha
As árvores me dão tudo
E não esperam nada de mim
Apenas que eu também cresça
Mas se engana quem pensa,
que as árvores crescem só
abaixo do solo, uma grande rede de raízes se faz
que se conecta e se comunica
Se eu fosse só, já não estaria mais aqui
Não sou só
Não ando só
Entre o Orun e o Ayê meu corpo caminha
Em cada folha, Ossain
Em cada árvore Oxóssi
A Terra é do velho
A água da chuva já foi de Oxum mas ela emprestou pra Oyá que devolve à Nanã regando as raízes do Povo de Pé
Quem sabe do mundo é o Tempo
Iroko Sô
Meus velhos, recebi de vocês a mensagem e transmito aos meus mais novos:
"Quem começou a luta pela liberdade nos navios tumbeiros, não viu o fim da escravidão.
Nem por isso a luta foi em vão.
Talvez eu morra sem ver muita coisa do que eu quero ver se modificar
Isso não quer dizer que não valeu a pena lutar."
Peço licença
Bato palma sim, é respeito!
Planto na terra a semente que quero ver brotar
Olorum queira, meu pai
Que eu a veja pelo menos germinar
Mas se eu voltar antes, meu pai
Eu agradeço por ter me permitido plantar
nesse chão, a semente da Justiça
regada de memória
Sei que não eu
Mas outros vão se alimentar
da reparação histórica
que nessa Terra há de brotar
Eu sou porque nós somos
aprendi com a mulher que lutou a partir dos nossos sonhos
que a vida é barra
mas que a gente aprende a se equilibrar
E quando menos se vê
medalhas estarão adornando o pescoço da melhor e mais completa ginasta do mundo
E quando menos se esperar
os povos indígenas suas terras irão retomar
os nomes e sobrenomes de origem africana os cartórios irão registrar
uma ministra negra uma cadeira no STF irá ocupar
Iremos então comemorar
a alegria de termos lutado, mesmo que cansados
Por sermos sementes vivas na Terra do esperançar.
3º lugar: "Ávido olhar". Autora: Esther Alves de Lima e Silva – Campus Centro, Turma 2108
Observo-o.
Prendo-me a cada detalhe com empenho.
Imponho meu julgamento sobre a matéria,
Cada fio de cabelo, cada linha em sua pele, cada trejeito.
Analiso-o com olhos de admiradora grave,
Embora com um sestro de afetação.
Tal afetação é meu castigo, razão de minha cólera,
Quisera eu ser capaz de dissimulá-la, sufocá-la.
Contudo, quanto mais me privo de olhar-te,
Mais te desejo, mais anseio fitar-te até sucumbir.
Não desejo tê-lo. Em verdade, este fulgor e esta luxúria
Que me transpassam são saciados pela simples observação.
Ter-te seria impossível e meu pecado é olhar-te.
Olho-o.
Estou faminta pela figura à minha frente,
Seria capaz de devorá-lo.
Percebo suas madeixas, negras como o ébano
E alinhadas em perfeita ordem,
Assemelham-se à grama recém-cortada
Sua alva pele tem a clareza, a suavidade de um jarro de porcelana
Olhos luzidios como um par de safiras,
Ao admirá-los sinto semelhante sensação a de ser tomada
Pela brisa marítima, cada vez mais veloz, cada vez mais intensa,
Cada vez mais impetuosa.
Contenho-me.
Mirar-te é um veneno.
Ao observar teus olhos dissimulados me sinto arrastada,
Entorpecida, presa neste mar revolto que é tua íris
Sou tingida de índigo, lentamente perco minha avidez
Devo parar, devo conter meus caprichos e volver ao meu orgulho.
Naufrago.
É inexequível resistir à tua imagem
Afoguei-me em teu olhar.
Pensara…
Pensara que, ao mergulhar naquele par de olhos, afogara-me.
Ressurjo, retorno à superfície.
E, ao longe, enxergo-te.
Aqueles teus olhos que antes tanto luziam, percebo que eram, em verdade, opacos.
Tuas madeixas que outrora foram grama verde, ébano frondoso,
Transformam-se em carvão,
Aquele belo sentimento, aquela primavera que habitara em mim,
Tu transformaste em devassidão.
Tua íris escurece, vejo um alaranjado reflexo,
Aquela clara porcelana está encoberta pela fuligem,
Desfeita em estilhaços.
Observo perplexa e tento entender como uma ação tua sem nexo
Fora capaz de revelar um paradoxo.
Não…
Fora capaz de expor minha própria ilusão.
Jamais me afogara no teu olhar.
Por engano,
Alimentara teu orgulho profano com grande emoção.
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